GABINETE DO REPRESENTANTE DA REPÚBLICA
PARA A REGIÃO AUTÓNOMA DOS AÇORES
SOLAR DA MADRE DE DEUS
ANGRA DO HEROÍSMO
Conferência sobre “Inovação Social na Intervenção com População Sem Abrigo” promovida pela Câmara Municipal de Ponta Delgada para assinalar o Dia Mundial da Erradicação da Pobreza e dos Sem Abrigo
Sessão de Abertura
Senhor Presidente da Câmara Municipal de Ponta Delgada, Dr. José Manuel Bolieiro,
Muito obrigado pelo honroso convite para participar nesta sessão de abertura.
Permitam-me que inicie a minha breve intervenção com uma referência à conversa que tive há algum tempo com o Presidente da República.
Embora se tenha tratado de uma conversa particular, julgo que não estarei a cometer uma inconfidência nem a violar o meu dever de reserva, uma vez que a maneira de ver do Presidente Marcelo Rebelo de Sousa é de todos bem conhecida.
Perguntei ao Presidente se ele não desejaria que o seu presente mandato fosse assinalado por um projeto que ficasse a constituir um marco da sua passagem pela magistratura suprema da Nação.
A sua resposta, que na minha opinião, revela bem o seu carácter e a sua filosofia de vida, foi que verdadeiramente, o que mais desejava era que no fim do seu mandato se pudesse dizer que tinha sido encontrada uma solução para o problema dos Sem-Abrigo.
Confrontar o problema da pobreza extrema e dos Sem Abrigo deverá, com efeito, constituir uma prioridade das nossas sociedades e dos nossos governantes.
Não posso deixar, portanto, de aplaudir a iniciativa da Câmara Municipal de Ponta Delgada e de Vossa Excelência Sr. Presidente, Dr. José Manuel Bolieiro, de promover a presente conferência assinalando o Dia Mundial da Condição da Pobreza e dos Sem Abrigo, e de saudar muito cordialmente todos os participantes e agradecer a sua prestimosa colaboração.
Minhas Senhoras e Meus Senhores
Vivemos numa sociedade democrática, em que os cidadãos têm assegurada a sua liberdade de expressão, de informação e de associação, o direito de escolherem os seus governantes através do sufrágio universal, o acesso a uma justiça imparcial e independente, o direito de participarem na vida pública.
O respeito e garantia dos direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos é uma pedra basilar da Constituição da República Portuguesa, que afirma logo no seu artigo 1º o valor fundamental da dignidade humana e o empenho na construção de uma sociedade livre, justa e solidária.
É uma tradução dos princípios da liberdade, igualdade e fraternidade, emanados da Revolução Francesa de 1789.
São princípios que implicam direitos inalienáveis de todo e qualquer cidadão, mas que ao mesmo tempo geram deveres que se impõem a todos. Aos deveres da comunidade para com os cidadãos, correspondem deveres dos cidadãos para com a comunidade.
A liberdade terá que ser conciliada com o respeito pelos outros e pelos seus direitos e liberdades.
A igualdade tem que ser compatível com a compensação do esforço individual e com a valorização do trabalho e a sua contribuição para o bem comum e para a realização pessoal de cada um.
A fraternidade é por sua vez o corolário da vida em comunidade, desde o nível familiar ao nível universal e gera obrigações de solidariedade e entreajuda, a todos os níveis.
São princípios universais que devem prevalecer em qualquer sociedade, para além das diferenças políticas, económicas, sociais ou culturais.
Atente-se no que se proclama no artigo 1º da Declaração Universal dos Direitos Humanos. E cito: “All human beings are born free and equal in dignity and rights. They are endowed with reason and conscience and should act towards one another in a spirit of brotherhood”.
Não haverá paz duradoura e verdadeira se estes princípios não forem respeitados, nem tão pouco serão possíveis avanços civilizacionais e o desenvolvimento económico e científico que os ignore, correrá o risco de conduzir a situações intoleráveis e insustentáveis.
Para a materialização destes princípios, são necessárias políticas que promovam as condições indispensáveis para um desenvolvimento harmonioso da sociedade, em que todos possam beneficiar de educação, cuidados de saúde e serviços de justiça, independentemente do seu nível económico, bem como de um sistema de segurança social de que ninguém esteja excluído.
Particularmente importante é a política de habitação, que garanta que todo e qualquer cidadão tenha um teto para se abrigar com as condições mínimas que assegurem a sua dignidade de ser humano.
Da mesma forma a ninguém deve faltar, em caso de necessidade, uma tábua de salvação que lhe garanta uma alimentação adequada e com os requisitos mínimos e, sobretudo, a esperança de uma vida melhor.
Para tal é absolutamente essencial que os cidadãos menos afortunados, em situação de pobreza e os Sem Abrigo, sintam que há lugar para eles na sua comunidade , que esta os não exclui, nem os despreza, nem os ignora, que lhes dá a mão e o coração, que os ajuda, para que se levantem e possam ocupar o seu lugar na sociedade, contribuir para a mesma e para a sua própria realização pessoal, salvaguardando a sua dignidade e autoestima.
Proporcionar aos Sem Abrigo um trabalho, num contexto motivador e fraterno e uma habitação digna, será a chave para se poder almejar um sucesso na nossa procura de uma solução.
Só assim poderemos todos dormir descansados com a nossa consciência tranquila.
Minhas Senhoras e Meus Senhores,
Espero que os vossos trabalhos sejam frutuosos e que deles resulte uma contribuição útil e efetiva para a solução de um flagelo que, nos dias de hoje, no século XXI, nos é insuportável e que não podemos aceitar que não possa ser resolvido.
Muito obrigado.
Ponta Delgada, 17 de outubro de 2019
Pedro Catarino