GABINETE DO REPRESENTANTE DA REPÚBLICA
PARA A REGIÃO AUTÓNOMA DOS AÇORES
SOLAR DA MADRE DE DEUS
ANGRA DO HEROÍSMO
COMEMORAÇÕES DO DIA DE PORTUGAL, DE CAMÕES E DAS COMUNIDADES PORTUGUESAS
NA REGIÃO AUTÓNOMA DOS AÇORES
INTERVENÇÃO DO REPRESENTANTE DA REPÚBLICA
Caros concidadãos
Começo por agradecer ao Sr. Presidente da Câmara Municipal de Angra do Heroísmo, Professor Álamo de Meneses, a prestimosa colaboração para a comemoração conjunta deste Dia. O meu muito obrigado também ao Sr. Professor Francisco Contente Domingues pela sua comunicação sobre Vasco da Gama e a globalização.
Vasco da Gama é, talvez, a figura mais icónica da nossa longa história de quase 900 anos. Ninguém melhor do que ele simboliza a nossa gloriosa epopeia dos descobrimentos, que colocaram o nosso país nos anais da História Universal, a ponto de o grande historiador inglês Arnold Toynbee distinguir a era antes do Gama e a era depois do Gama.
Vasco da Gama personifica as melhores qualidades do povo português: carácter forte e determinado, indispensável para uma liderança forte e uma execução eficaz, humanidade no relacionamento com os seus próximos, coragem e espírito de abnegação, ânimo indefetível, perseverança, amor à sua Pátria.
Tudo isto levou ao sucesso de uma missão, tida na época como impossível e que elevou o nosso pequeno país aos píncaros da História da Humanidade.
É com orgulho que hoje celebramos a memória do nosso querido e grande herói.
Ele deve constituir para todos uma fonte de energia, de autoestima, de ânimo, que nos leve a aplicarmo-nos, com afinco e com os olhos postos no futuro, na construção de uma vida melhor, para nós e para a nossa nação, para os nossos filhos e netos. Enfim, para toda a Humanidade.
Caros concidadãos
Bem hajam pela vossa presença e por, com ela, darem vida e abrilhantarem esta cerimónia.
Festejamos hoje o dia de Portugal, de Camões e das Comunidades portuguesas, num ano já de si marcado pela comemoração do 40º aniversário da Constituição de 1976 e pelo 30º aniversário da entrada em vigor do tratado de adesão de Portugal às então designadas Comunidades Europeias, hoje União Europeia.
Ambos os momentos marcaram de forma indelével o Portugal que, com indisfarçável orgulho patriótico, hoje celebramos de forma festiva.
O primeiro, porque trouxe abertura democrática onde antes havia uma sociedade fechada à mudança e ao mundo; o segundo porque trouxe integração e participação em espaços geopolíticos mais amplos onde antes havia isolamento e falta de horizontes.
O primeiro porque levou transparência e partilha de poder onde até aí reinava o secretismo e o centralismo; o segundo porque permitiu aceder a recursos sem precedentes, promovendo ativamente o desenvolvimento, onde sempre tinham existido constrangimentos estruturais e marasmo económico.
Ambos os momentos acarretaram por isso, para o nosso País, profundíssimas alterações de natureza política, com ampla projeção nas instituições públicas e na vida de todos os cidadãos. São momentos fundantes de um Portugal moderno, que – como se lê logo no artigo 1º da Constituição – tem por base os valores da dignidade da pessoa e da soberania popular e que, com estas pedras angulares, se empenha na construção de uma sociedade mais livre, mais justa e mais solidária.
Recordar, neste dia especial, cada um destes dois momentos históricos – e prestar justa homenagem aos seus protagonistas, na Assembleia Constituinte e na negociação e celebração do Tratado de Adesão às Comunidades – é, ao mesmo tempo, contar duas histórias de sucesso: a de um País que se reconstruiu sob a forma de Estado de Direito e a de um País que se redescobriu na sua vocação europeia ocidental. Experiências não naturalmente de um sucesso imaculado, mas de um sucesso humano, pontuado pela imperfeição e pelo erro, que dão ao homem a oportunidade para se reerguer e para se superar.
E se convoco estas duas efemérides aqui neste preciso lugar, em Angra do Heroísmo, na sede da mais alta instituição da República em território insular, é também para sublinhar que os Açores (assim como a Madeira) não ficaram, nem poderiam ficar, esquecidos nestes caminhos paralelos de construção de um Portugal democrático e de uma Europa coesa. Foram e são também protagonistas fundamentais neste processo de mudança e colheram os respetivos frutos.
Com efeito, com a Constituição de 1976, os antigos distritos autónomos das ilhas adjacentes dos Açores (e da Madeira) foram erigidos em regiões autónomas, dotadas de estatutos político-administrativos próprios e de um amplo leque de atribuições legislativas, administrativas e financeiras. Atribuições que, em sucessivas revisões constitucionais e estatutárias, foram sendo declinadas e alargadas, de modo a permitir aos órgãos de governo próprio – agora democraticamente legitimados – satisfazer as justas aspirações das populações regionais em matéria de participação política e de desenvolvimento económico-social.
Em causa está uma opção absolutamente estruturante da Constituição, que qualifica simultaneamente a unidade do Estado e a autonomia político-administrativa dos arquipélagos dos Açores e da Madeira como limites materiais de revisão constitucional, colocando estes princípios – tanto quanto é legítimo a uma geração fazê-lo – fora do alcance reformador das gerações subsequentes.
Por sua vez, com o ingresso nas Comunidades Europeias – e com a posterior revisão dos respetivos Tratados Constitutivos até chegar à atual União Europeia – os Açores (bem como a Madeira) viriam designadamente a fazer-se representar no Parlamento Europeu, a ter assento próprio no Comité das Regiões e a beneficiar do regime das regiões ultraperiféricas, que confere acesso privilegiado aos fundos europeus de coesão.
A autonomia político-administrativa tem seguramente constituído um fator determinante do assinalável progresso económico-social dos Açores. Mas a solidez e a estabilidade do quadro institucional democrático em que esta se move, tanto a nível nacional como regional, bem como a solidariedade firme e persistente da República, mormente no plano financeiro, assim como as políticas de coesão da União Europeia, não o são menos.
Nenhuma casa se constrói com um único pilar, por mais forte que ele seja. A força resulta da conjugação de esforços.
Mais ainda, em democracia, a força das ideias e das instituições que as concretizam resulta mais do debate público, desinibido e vibrante, do que propriamente da apologia de um consenso compulsivo, que constrange a liberdade individual, obnubila a divergência crítica e esbate a imaginação criativa. A democracia tem na liberdade de expressão a sua fonte de oxigénio e, por isso, tem dificuldade em respirar sob a pressão do consenso artificial, do politicamente correto e da padronização do discurso político e ideológico.
Nenhuma ideia – nem mesmo as que nos parecem mais sublimes - ganha em estar acima da controvérsia e da crítica pública. A nossa adesão individual aos princípios constitucionais, da democracia, da liberdade, da transparência, da tolerância ou da autonomia, não deve excluir o debate profundo sobre o seu significado concreto e os seus limites numa sociedade democrática. As nossas preferências pessoais em relação aos valores culturais da portugalidade e da açorianidade não nos devem impedir de reconhecer que esta última – tal como se afirma expressamente no preâmbulo do Estatuto dos Açores – é uma forma “singular e orgulhosa de portuguesismo”.
Distintos convidados
Aproveito a ocasião para dirigir uma saudação muito especial à Sra. Presidente da Assembleia Legislativa, hoje aqui representada pelo Sr. Vice-Presidente, Dr. Ricardo Cabral.
A Sra. Presidente da Assembleia Legislativa é a primeira figura no quadro regional, corporizando em si o poder parlamentar, emanado do povo, que tutela, legitima e fiscaliza o Executivo regional. É ela que lidera o órgão primordial da autonomia da Região, que representa a vontade e as aspirações dos Açorianos.
Saúdo também todos os deputados regionais e os órgãos dirigentes de todos os partidos políticos.
Aproximando-se a data das próximas eleições legislativas nesta Região, permitam-me que sublinhe o papel importante que todos têm no funcionamento da democracia em que vivemos, para que possa haver um debate plural, saudável e construtivo, baseado no respeito mútuo e na civilidade, que possa gerar uma escolha livre e esclarecida pelos eleitores.
As minhas saudações amigas igualmente para o Sr. Presidente e membros do Governo Regional que detêm nas suas mãos a governação desta Região. Estendo essas saudações às autoridades autárquicas das nove ilhas da Região.
A todos, desejo os maiores êxitos no exercício das suas missões.
Cumprimento cordialmente os magistrados judiciais e do Ministério Público, os militares das Forças Armadas e agentes das Forças de Segurança e todos os funcionários do Estado que desempenham funções na Região.
Todos dão um muito relevante contributo para a sustentabilidade da autonomia e para o bem-estar dos Açorianos.
Merecem, pois, o nosso apreço e reconhecimento.
Bem hajam pelo vosso bom trabalho e pela vossa dedicação ao serviço público.
Distintos convidados
É tradição que nesta data sejam impostas pelo Representante da República as insígnias das condecorações concedidas por Sua Excelência o Senhor Presidente da República a cidadãos e instituições açorianas que se notabilizaram pelas suas atividades públicas ou privadas, honrando os Açores e Portugal.
Este ano são agraciados o Sr. Vitor Manuel Sampaio Baptista e o Lar Mãe de Deus.
Ao primeiro e ao Presidente da Direção do Lar Mãe de Deus, Sr. Engenheiro José Manuel Martins Tavares Rodrigues, aqui presentes, exprimo desde já as minhas felicitações.
O Sr. Vitor Baptista, nascido nesta ilha Terceira, ainda muito jovem começou por alargar os limites do seu mundo insular, como embarcado na marinha mercante, sulcando as ondas do oceano que nos rodeia.
Foi já um sinal do seu espírito de aventura e da sua coragem. A sua vontade de vencer na vida e de melhorar a sua sorte levou-o aos Estados Unidos, onde continuou no seu trilho, trabalhando com afinco e ao mesmo tempo investindo na sua educação e qualificações profissionais.
Imbuído de um espírito de iniciativa, que certamente a sociedade americana fez despertar, desenvolveu a sua atividade no sector da segurança alimentar, criando a sua própria empresa que fez crescer e prosperar.
A sua vida é um bom exemplo de trabalho e valorização pessoal.
O sucesso que teve não o fez esquecer as suas raízes familiares e a sua terra natal.
Para honrar a memória do seu pai, grande entusiasta do Benfica, ofereceu uma estátua de Eusébio que se pode admirar junto ao estádio da Luz e uma réplica da mesma à cidade de Ludlow, em Massachusetts, nos Estados Unidos.
E como prova do orgulho na sua terra e na história gloriosa do seu país, acaba de oferecer uma estátua de Vasco da Gama que ficará nesta cidade para as gerações futuras.
A condecoração que hoje recebe traduz o apreço pela sua vida, pelo seu amor à Mãe Pátria, pela sua generosidade e pelo seu exemplo.
Esta distinção deverá ser igualmente vista como o reconhecimento da importância atribuída às comunidades portuguesas no estrangeiro e à diáspora açoriana, consideradas como um ativo que deverá ser valorizado e potenciado em todas as suas vertentes.
A outra condecoração, hoje atribuída, distingue uma instituição não-governamental de solidariedade social – o Lar Mãe de Deus – que desde há mais de um século se dedica à ajuda aos mais necessitados e mais vulneráveis.
Devo dizer que um dos aspetos que pessoalmente mais me impressiona nos Açores, é o espírito de solidariedade, de entreajuda e de partilha que preside às relações humanas. Fruto da ação da Igreja Católica, por um lado, mas também do carácter de um povo habituado a enfrentar as agruras de um clima tantas vezes inclemente e os caprichos de uma natureza imprevisível, este espírito de solidariedade é um fator fundamental da coesão social e do tão forte sentimento de comunidade que caracteriza a Região.
O Lar Mãe de Deus foi fundado na cidade de Ponta Delgada, em 1855, com a denominação “Asilo da Infância Desvalida”. Tem-se vindo a dedicar ao acolhimento de crianças e jovens em situação de risco, provenientes de famílias desestruturadas. A este objetivo central foram sendo acrescentadas outras valências, como a ajuda a mães adolescentes ou futuras mães, ajuda a jovens do sexo feminino inscritas na Universidade dos Açores, com dificuldades financeiras, acolhimento de jovens e adolescentes com problemas de integração social, etc. O Lar Mãe de Deus é hoje, fruto de uma conjugação de esforços da sociedade civil e do apoio das autoridades regionais, uma instituição com uma notável relevância social no combate à pobreza e às desigualdades sociais.
A dedicação e empenho dos seus quadros e colaboradores, onde se destacam as irmãs de S. José de Cluny, são um exemplo para a sociedade e dignos do nosso reconhecimento e gratidão.
Distintos Convidados
Gostaria finalmente de deixar aqui registado o meu reconhecido agradecimento ao Sr. Luís Bettencourt, guitarrista e compositor de mérito, natural desta nossa ilha Terceira, que nos brindou com um trecho musical no início da nossa sessão e que irá de novo atuar, para nosso deleite, no final da mesma.
Um muito obrigado também para todos os que ajudaram na preparação das cerimónias do dia de hoje, designadamente aos membros do meu gabinete, aqui sediados ou que se deslocaram de Lisboa a Angra do Heroísmo, para o efeito, pela sua colaboração e apoio.
Distintos convidados
Apresento a todos vós os melhores votos de felicidades, extensivos às vossas famílias, no seio de uns Açores cada vez mais prósperos.
Pedro Catarino
Angra do Heroísmo, 10 de junho de 2016