ANGRA DO HEROÍSMO
Discurso de S.E. o Representante da República para a Região Autónoma dos Açores
10 de junho de 2012
Distintos convidados
Caros e Caras compatriotas
Obrigado por terem aceite o meu convite.
É para mim uma honra acolher-vos mais uma vez neste solar da Madre de Deus para celebrarmos conjuntamente o Dia de Portugal e proclamarmos o orgulho que sentimos na nossa identidade nacional, fruto da nossa história secular, da nossa cultura e da nossa língua.
Este sentimento de pertença à mesma comunidade, a nação portuguesa, faz com que vibremos com os símbolos da nossa Pátria comum e com as nossas vitórias, coletivas e individuais. Reflete-se também na fraternidade que nos une e que nos impele à solidariedade sempre que temos que enfrentar e superar adversidades ou insuficiências.
Distintos convidados
Caros açorianos e açorianas
A identidade nacional, que todos sentimos, coexiste, no caso dos Açores, com um forte sentimento de pertença a uma comunidade arquipelágica que une os açorianos das 9 ilhas e que se revela em traços culturais próprios e em aspirações próprias quanto à sua organização político-administrativa e à gestão dos seus recursos e das suas vidas.
A celebração de hoje tem lugar poucos dias depois da celebração do Dia dos Açores em que tive o prazer e a honra de participar convosco e em que os açorianos tão calorosamente patentearam o justo orgulho que todos sentem na sua identidade singular, que na feliz expressão usada pelo Senhor Presidente da Assembleia Legislativa não apaga nem nunca apagará a sua “imorredoira portugalidade atlântica”.
É uma dupla alegria, um orgulho a dobrar que ilumina a vida dos açorianos e lhes dá alento.
Nesse dia, os açorianos celebraram uma vez mais, a sua autonomia, conquistada com o advento da democracia em Portugal, após uma longa caminhada e porfiados esforços.
Essa autonomia representa a assunção pelos açorianos nas suas mãos, através de órgãos próprios de governo por si sufragados, das suas vidas e da gestão dos seus recursos e dos recursos que lhe são disponibilizados. Representa também a afirmação de uma identidade própria, do seu modo de viver característico, do que são e do que querem ser como açorianos.
Esta afirmação de “nós, os açorianos”, que é certamente uma expressão da sua força e que traz ao nosso espírito a famosa frase do Presidente Obama “yes we can”, assinala a sua determinação em caminharem pelo seu pé, pelo seu esforço e conforme o seu próprio julgamento. Naturalmente, no respeito do quadro constitucional.
É também uma afirmação de cidadania e de participação cívica e democrática.
Os últimos 36 anos têm demonstrado que é um caminho profícuo. O percurso percorrido foi altamente positivo.
Basta atender na subida do rendimento per capita nos Açores, que já em 2010 foi de 94% da média nacional, mais elevado do que em Trás-os-Montes ou no Alentejo.
Os equipamentos públicos que hoje existem nos Açores, as infraestruturas, as qualificações da população, o acesso à saúde, à educação, à assistência social, a defesa do ambiente, etc., etc., não têm comparação com o que eram nos anos 60 e começo dos anos 70 do século passado.
Existe muito ainda a fazer. Persistem insuficiências e bloqueios que têm que ser superados e largas potencialidades a ser desenvolvidas.
Mas a riqueza dos Açores está sobretudo nos açorianos que já mostraram que têm resiliência e capacidade para vencerem as dificuldades, não só nas ilhas, mas também no resto do mundo.
A diáspora açoriana é um exemplo notável para todos nós pelas qualidades humanas e de trabalho e pela consciência cívica e espírito comunitário que demonstraram nos países de acolhimento, sobretudo na América, que eu conheço bem, onde os açorianos e seus descendentes são respeitados e apreciados e onde alcançaram posições de grande destaque e prestígio no campo dos negócios, da política, da cultura e da investigação científica.
É importante que esses açorianos e seus descendentes, que continuam a manter o seu apego à família e às suas raízes, às suas tradições e aos valores das suas ilhas, mantenham o contacto com os Açores, que os visitem e que se interessem pelos seus desenvolvimentos políticos, económicos e sociais.
Os Açores precisam do seu espírito de iniciativa, das suas ideias, da sua criatividade, da sua mentalidade adquirida no novo mundo da América.
Desejo, neste Dia de Portugal em que todos os portugueses espalhados pelo mundo se devem unir e dar as suas mãos, enviar uma saudação cordial à diáspora açoriana e manifestar-lhe o apreço e admiração com que é tida.
A propósito do papel da diáspora, permitam-me que sublinhe a importância da mobilidade e do intercâmbio das pessoas. Este intercâmbio é condição da criatividade e valorização das sociedades que se devem renovar e arejar sob pena de correrem o risco de, fechadas sobre si mesmas, se definharem e estiolarem.
Não é felizmente o caso dos Açores.
Portugal providencia aos Açores um espaço alargado dando-lhe uma massa crítica e uma rede de contactos e fluxos recíprocos a todos os níveis.
Da mesma forma, com a adesão de Portugal às Comunidades Europeias, hoje União Europeia, os Açores integram um espaço comunitário de quase 500 milhões de cidadãos de que fazem parte países com índices de desenvolvimento muito elevados e com culturas riquíssimas.
Aqui também a mobilidade e os fluxos deverão ser incentivados. Sobretudo as novas gerações, os mais novos, devem ser preparadas e estarem prontas para tirarem proveito, para si próprias e para os Açores, das possibilidades que a Europa lhes proporciona.
Distintos convidados
O regime autonómico da Região foi consagrado na Constituição de 1976.
Desde então tem vindo a ser reforçado e densificado sendo hoje um elemento consolidado do regime democrático português.
As regiões autónomas têm atualmente largos poderes de participação na definição das políticas nacionais que relevam dos seus interesses (para além da representação direta na Assembleia da República pelos deputados que elegem) e de condução dos assuntos respeitantes à sua própria governação.
O sucesso da autonomia da Região é visto com naturalidade e simpatia pela generalidade dos portugueses, que considera as aspirações dos açorianos não só como justas e legítimas, mas também como responsabilizadoras e dinamizadoras para os próprios.
A força e o progresso das partes só pode dar força ao todo, que ganha assim dimensão e escala podendo elevar também os seus índices de desenvolvimento humano e material.
A Constituição estipula ainda que a Região, para além de dispor das receitas fiscais nela cobradas ou geradas, participe nas receitas tributárias do Estado, de acordo com um princípio que assegure a efetiva solidariedade nacional e de outras receitas que lhe sejam atribuídas.
Este princípio pressupõe deveres naturais de reciprocidade entre as parcelas do território nacional que implicam um esforço comum na atenuação das assimetrias regionais.
A concretização deste princípio de solidariedade tem sido realizada por diversas formas que procuram seguir critérios objetivos que tenham em conta a realidade dos factos com respeito às respetivas capacidades e necessidades e a equidade que deve presidir a uma justa repartição de encargos e benefícios.
Com o esforço conjunto das duas partes a sustentabilidade económico-financeira do modelo autonómico tem sido adequadamente alcançada.
Como é sabido, Portugal atravessa atualmente uma dura crise. Na sequência do descalabro financeiro e da eminência de insolvência teve que aceitar o plano de assistência financeira internacional que foi negociado e assinado com a Troika, representando o Fundo Monetário Internacional, o Banco Central Europeu e a Comissão Europeia.
Por mais que nos doa ou custe, é esta a situação em que nos encontramos e que temos que enfrentar.
Desfocarmos a nossa atenção com discussões intermináveis sobre a pedra filosofal nada resolverá e estaremos a enganar-nos a nós próprios.
Assumimos compromissos e temos que os cumprir.
É assim nos nossos negócios privados e assim deve ser nos negócios públicos.
Teremos que cumprir o nosso compromisso de consolidar as nossas finanças públicas e restabelecermos assim a nossa credibilidade como país.
Teremos que o fazer através da austeridade que temos que impôr a nós próprios e, imperativamente também, através do crescimento da nossa economia, que temos, por todos os meios, que promover.
Soa como a quadratura do círculo, mas é o que temos que fazer.
A situação é agravada ainda pelos problemas sistémicos que afligem a União Europeia e pelas dificuldades gravíssimas que alguns dos nossos principais parceiros estão a atravessar.
Esperam-nos, pois, tempos muito difíceis, que afetarão duramente o país, com o sofrimento daí resultante sobretudo para os segmentos mais vulneráveis da nossa sociedade.
Não nos prepararmos, não preparar a população para as dificuldades iminentes e não a mobilizar para o esforço que terá que ser feito, seria seguir o exemplo da “cigarra” na fábula de La Fontaine.
Não é certamente a filosofia dos portugueses e açorianos, sobretudo dos mais modestos, habituados às agruras da vida e ao trabalho duro.
As medidas de austeridade que têm um impacto mais duro na população já estão a sentir-se nos Açores.
Quem o diz é o Bispo de Angra que conhece bem a realidade dos Açores, numa notável entrevista que concedeu há dias à Agência Ecclesia e que eu aconselho todos a ler na íntegra com toda a atenção.
Veja-se o nível do desemprego, a paralisia da construção, o facto de os jovens não estarem a voltar para as suas ilhas por não existirem postos de trabalho para os cursos que realizaram.
As ilhas pequenas estão a perder a população jovem.
Permita-me, Senhor Bispo, que o continue a citar: “Os Açores são uma região pobre e muito dependente do exterior. Não quero trair os meus conterrâneos dizendo que não há dificuldades. Mas tudo tem os seus limites. Precisamos que Portugal não nos deixe. Somos uma Região Autónoma mas fazemos parte de Portugal”. Fim de citação.
Mais sério ainda, e agora sou eu que o digo, é o facto de no Continente as dificuldades serem idênticas.
O espectro do desemprego, a fuga dos jovens, também lá existem.
É claro que Portugal não irá enjeitar uma parte de si próprio. Como poderia fazê-lo!...
Estou certo de que continuará a honrar as suas responsabilidades constitucionais que são também responsabilidades históricas e patrióticas.
Mas teremos que lutar juntos, num espirito de cooperação e concertação entre os órgãos portugueses nacionais e os órgãos portugueses regionais. Só assim venceremos.
Pertencemos todos à mesma Nação, à mesma Pátria.
Deverá haver uma consulta contínua, construtiva, um diálogo correto e harmonioso em que ambas as partes, sem arrogância, nem acrimónia, analisem as situações com objetividade e elevação e procurem, com razoabilidade, chegar a consenso.
Deixo pois aqui o meu apelo, que dirijo aos órgãos da República e aos órgãos regionais, para que haja mais diálogo e melhor diálogo com vista à superação da crise e à construção de um futuro melhor para os Açores.
Deverá igualmente haver, na minha opinião, por ambas as partes, uma maior preocupação com as suas políticas de informação pública, para que elas sejam mais proactivas no sentido de esclarecer as questões de forma completa com uma apresentação factual dos dados, essenciais para a compreensão das matérias. Essa informação deverá ser simples e clara e ser apresentada de forma sistemática, objetiva e acessível para o grande público.
Desejava fazer aqui uma referência às funções que o Estado exerce diretamente na Região no quadro das suas responsabilidades e competências.
Elas irão estar também no futuro sujeitas aos constrangimentos derivados da crise económico-financeira que afeta o país transversalmente.
Deverá haver consultas entre o Governo da República e o Governo Regional e outras entidades da Região, prévias a quaisquer cortes ou alterações estruturais dos respetivos serviços, de modo a que os mesmos possam ser cuidadosamente ponderados à luz de todos os fatores em jogo e do seu contexto específico.
Estou certo que tal não deixará de ser o caso.
Queria aproveitar a ocasião para dirigir uma saudação muito especial ao novo Comandante Operacional dos Açores, Senhor Vice-Almirante Augusto Mourão Ezequiel, que acaba de assumir o seu alto cargo.
A sua presença na Região e o cumprimento da sua missão são um elemento essencial da coesão nacional.
Desejo-lhe os maiores êxitos e asseguro-lhe que poderá contar com todo o meu apoio.
Dirijo igualmente uma saudação cordial às Forças Armadas e às Forças de Segurança presentes na Região e seus quadros superiores e manifesto-lhes o meu apreço e reconhecimento pela ação extremamente importante que aqui desempenham.
Igualmente saúdo os Magistrados Judiciais e do Ministério Público e os funcionários judiciais, bem como todo o funcionalismo do Estado a desempenhar funções na Região.
Todos têm um papel muito relevante para o sucesso e sustentabilidade da autonomia, para o bem-estar dos Açorianos e para o prestígio de Portugal e todos são merecedores do nosso reconhecimento.
Distintos convidados
Caros amigos e amigas
Cheguei aos Açores para assumir as minhas funções de Representante da República há um ano.
A minha estadia tem sido muito enriquecedora. É bom viver nos Açores e agradeço a todos os Açorianos a simpatia com que me acolhem e me têm tratado a mim e à minha mulher.
As sociedades que prezam e valorizam as suas instituições e os seus incumbentes são sociedades que valorizam a sua história e a sua cultura, os princípios democráticos em que essas instituições assentam e o respeito mútuo que todos os cidadãos merecem.
Quero ainda agradecer, na pessoa do Senhor Presidente da Assembleia Legislativa, a todos os seus membros pela boa cooperação que me foi sempre oferecida e pelo bom relacionamento entre os nossos respetivos serviços.
Para o Senhor Presidente do Governo Regional, que desafortunadamente não pôde estar aqui hoje connosco, vão também os meus agradecimentos pela sua correção nas nossas relações profissionais e pessoais, atitude que caracterizou igualmente todo o Governo Regional. Quero exprimir-lhe e deixar aqui registado o meu apreço pessoal pela sua brilhante carreira politica e desejar-lhe a si e à sua mulher as maiores felicidades futuras.
Tive já oportunidade, nestes 12 meses, de visitar as 9 ilhas, cinco delas acompanhando a visita oficial que o Senhor Presidente da República realizou em Setembro do ano findo e que constituiu um momento simbólico de alto significado.
Embora de curta duração, deram-me o ensejo de me aperceber das tradições próprias e especificidades que cada uma das ilhas apresenta em relação às outras.
Formam no entanto, indubitavelmente, uma unidade, comungando de uma cultura e de sentimentos comuns e de uma identidade igualmente comum.
São todas de uma beleza natural deslumbrante e merecem que nelas passe estadias mais prolongadas que me deem ocasião de contactar as suas gentes e as autoridades locais.
Tenho intenção de efetuar uma segunda ronda de visitas e gostaria de a iniciar com uma estadia de uma semana no Corvo, que penso fazer, juntamente com a minha mulher, no próximo janeiro.
Almejo desta maneira aproximar-me da alma do povo corvino e experimentar a sensação do isolamento e da força da natureza agreste e da fúria do mar na estação invernal.
Talvez consiga, através dessa experiência, imaginar o que é viver uma vida inteira ou pelo menos umas dezenas de anos num espaço tão limitado geograficamente e assim compreender melhor os problemas e anseios que os corvinos enfrentam nas suas vidas.
Espero que me acolham com simpatia e a mensagem de que serei portador será de solidariedade e fraternidade.
É tradição que neste dia sejam impostas pelo Representante da República, em representação e em nome do Senhor Presidente da República as insígnias das condecorações concedidas a cidadãos e instituições açorianas que se notabilizaram pelas suas atividades relevantes, públicas ou privadas, honrando os Açores e Portugal.
Este ano será agraciado o Senhor João António Gomes Vieira, ilustre florentino que dedicou toda a sua vida à promoção da sua ilha e dos Açores nos campos da antropologia cultural, património museológico e investigação e divulgação das atividades marítimas com destaque para a área da baleação.
Contribuiu também para o desenvolvimento dos laços com instituições americanas, em especial de New Bedford, e de outros países.
Será igualmente agraciada a Santa Casa da Misericórdia do Nordeste que completou no mês passado 100 anos e tem desenvolvido uma notável ação no campo da assistência social durante muitas gerações, cuidando dos idosos e desvalidos num magnífico exemplo de solidariedade para com os mais necessitados.
Desde já apresento ao ilustre agraciado, Sr. Gomes Vieira, e ao Exmo. Provedor da Santa Casa da Misericórdia do Nordeste, Dr. Pacheco de Medeiros, que tive o prazer de conhecer há dias, as minhas sinceras felicitações.
Ainda este ano terão lugar, em Outubro próximo, eleições para a Assembleia Legislativa que determinarão também quem será o próximo Presidente do Governo Regional.
É um acto, obviamente, de grande importância, para o futuro dos Açores e dos açorianos, de que estes não se devem alhear, deixando a decisão nas mãos dos outros.
A autonomia, que tanto custou a ser construída, afirma-se e exerce-se através do voto.
O voto é uma demonstração de maturidade e um dever cívico.
Apelo assim a todos os eleitores açorianos que participem de forma esclarecida no próximo ato eleitoral, assumindo a sua quota-parte de responsabilidade na escolha dos seus representantes e servidores.
O vosso futuro está no vosso voto.
Gostaria ainda de exprimir os meus agradecimentos ao Sr. Capitão Serafim Carneiro, Presidente do Orfeão da Praia da Vitória e aos membros do Coro Juvenil que abrilhantaram este dia nacional e que cantaram magnificamente.
Muito obrigado igualmente ao Sr. Engenheiro Jorge Belerique, dos Serviços Florestais da Terceira, pelo amável empréstimo de uma trintena de árvores e pela sua tão eficiente cooperação.
Muito obrigado ainda ao Sr. Carlos Silva, Presidente da Filarmónica União Católica da Serra da Ribeirinha e ao Maestro Domingos Brasil, bem como aos membros da Filarmónica, que atuou brilhantemente na cerimónia de hoje de manhã.
O meu reconhecimento também ao pessoal do meu Gabinete em especial às minhas secretárias Lurdes e Rosário pela sua ajuda e ao pessoal deste Solar e da Quinta da Nossa Senhora de Oliveira, em especial à Elisabete que fez a comida, à Filomena que fez os doces e à Fátima que arranjou as flores.
Termino desejando a todos as maiores felicidades, para vós e para as vossas famílias, fazendo votos para que o futuro dos Açores seja brilhante e radioso.
Obrigado
Angra do Heroísmo, 10 de junho de 2012